quarta-feira, 3 de março de 2010

Ele morava na mesma casa desde que nascera. Conhecia pouco do mundo. Os dias eram iguais. Acordava quinze para seis. Espreguiçava - sempre do mesmo lado - descia da cama sempre a perna direita, depois a esquerda. Subia o tronco devagar, não raramente, perdia o equilíbrio, e tinha que superar suas forças para não tombar na cama. A parte mais complicada era colocar os pés no chão e saber - muito angustiado - que teria que depositar nos seus pobres tornozelos, o peso do seu corpo.  
Seguia para a cozinha, abria a janela - primeiro a dá esquerda, depois a em cima da pia - e respirava. Abria a torneira e enchia a chaleira de água para o café.
Ia para o banheiro em seguida. Mas, nesse dia, algo estranho aconteceu. Ao passar pela soleira da porta sentiu uma presença atrás dele. Uma espécie de frio na espinha. Arrepiou-se dos pés a cabeça. E teve a nítida, quase certeira, visão de uma moça no corredor. Ela olhou bem fundo nos seus olhos e como se dançasse, deslizou até bem perto dele. Seu hálito era quente e tinha um suave perfume de flores. Ele não se espantou, apenas por uns intantes fechou os olhos pra melhor sentir todo o momento. Quando abriu, sentiu algo frio que envolvia seu corpo. Não conseguia se mexer. Apenas os olhos se moviam. E assim ficou - não bem sabe por quanto tempo - dormiu, acordou e continuava lá. E dormiu mais ainda. Foi acordado de sobresalto por um estrondo e pensou: Finalmente deram por minha falta. Mas no mesmo momento, pensou: Mas quem pode ter se lembrado de mim? Com o olhar turvo, viu dois homens se aproximarem, eles o olhava com uma cara estranha. Examinaram, mas nada falaram. Anotavam, andavam pra lá e pra cá. E nada faziam. Por que não o tiravam daquela incomoda posição? O chão era frio, o corpo estava frio. Novamente o sono lhe caia, tentando novamente cerrar seus olhos, mas ele lutava...Estanhou mais ainda quando os mesmos homens tentaram sufocá-lo com um lençol e bruscamente o levantaram e jogaram numa caixa. Seu corpo estalou ao bater no fundo da caixa e com seu grito surdo, ele finalmente foi conhecer o mundo.

Um comentário:

  1. me lembrou um curta q vi ainda no rio, em q o narrador era um defunto q estava exatamente... dentro de uma gaveta, debaixo de um lençol, com direito a etiqueta no dedão do pé e tudo. e observava todos os médicos q vinham retirá-lo pra fazer autópsia ou sabe-se lá o q. achei um belo de um ponto de vista!

    beijos!

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