sábado, 19 de junho de 2010

Saramago

Pelos seus olhos eu descobria o que talvez se passasse na alma. O vento que agora ruge em minhas vidraças chora junto a mim sua ausência. Porém como diz Drummond ..." ausência não é falta". Falta em poder através de seus olhos poder devendar outros mundos, mas não falta quando posso recorrer as tuas palavras e mesmo já tendo lido outros mundos ainda descobrirei. 

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Qual seria a escolha?

A escolha é sempre difícil? Ela pensava enquanto escovava os dentes. Acho que não! Ela mesma respondia entre uma cuspida e outra. Eu sou é complicada. Refletia ao olhar a imagem do seu rosto meio distorcido no espelho pela fumaça do banho quente.
Mas por que Diabos temos que escolher, não seria mais fácil ir vivendo e as coisas acontecendo e nós não termos que decidir nada. Mas não um não decidir por desanimo, mas sim por ter coisas mais importantes pra fazer. Eu mesma preferia caminhar agora ao invés de trabalhar. Eu deveria ter mudado de cidade, taí novamente a escolha!!! Irritante. Eu não deveria nada. Eu queria comer brigadeiro, mesmo que desse piriri. Queria pintar o cabelo de azul. Sair de amarelo canário. Unhas pretas e óculos verdes. Simplesmente não ser percebida. Eu queria não ter decidido ser assim, eu queria assado. Peixe assado, batata assada, pernil, abobrinha, bolo, biscoito, mel, salada fresca, limo nos cantos do box. Cheiro de tudo que eu gosto exalando na hora que eu gosto. Eu queria ser eu, e ser você amanhã, aí voltaria a ser eu e seria a vizinha no dia seguinte, aí ia pulando de pessoa para pessoa. Ia até ser o bem-te-vi do apto em frente. Queria ser calda de chocolate, noite escura, céu estrelado, aroma de anis, beijo na boca, mãos dadas, ser a torre da igreja, sino e sina. Ser hóstia do padre, ser batina, ser fé e ser medo. Ser meio, ser frente, ser bola de gude.
Ser ruga na testa, nariz afilado, cabelo sebento e fivela de prata.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

a mastigadeira

Os dentes soltos na boca fugiam de quando em vez, antes ela cuidava para colocá-los para dentro, mas fazia tempo, em que eles voltavam sozinhos. Ela mastigava o dia todo, ruminando suas falas passadas e outros discursos inventados numa língua que ninguém compreendia. Seu mundo, era aquela cama com lençóis arrumadinhos e cheiro de limpos e a figura do sagrado coração de Maria em cima da cômoda. O universo esticava um pouco quando mais ou menos de duas a três vezes por dia a levavam até o sol. E deixava-a sentada  confortavelmente numa cadeirinha. Ela ia e vinha num balanço que no início a deixava tonta agora nem percebia. Mas dava movimento aos seus fugidíos pensamentos que se entrecortavam numa orgia que misturavam cenas reais e imaginárias e inimagináveis.  
Mas um certo dia, num dos raros momentos de lucidez e mobilidade, ela escutou um barulho que vinha de um canto. Ergueu o pescoço na tentativa de poder visualizar o que era aquilo... e era...era brilhante, reluzente e voando feito louco, um....

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Era o início.

Entre os pés ríspidos ela traçava caminhos ondulantes, crispava toda vez que via um friso no chão. Saltava com leveza estonteante. Ela delicada, elegante, com traços finos e bem delineados, porém não era bonita exatamente. Era interessante. Os negros cabelos perpassavam os ombros. A cintura fininha, dava voltas em duas no cinto de um amarelo desmaiado. A saia de flor tinha um remendo na ponta. A blusinha enjoada com poas muito clarinhos fazia um estilo amassado. Pelo transparente tecido via-se a combinação, muito bem limpa, embora já contasse alguns anos. Os sapatos eram pretos quase no mesmo tom do cabelo e no couro as dobras já existiam, mas ela disfarçava com graxa todas as manhãs.
Assim ia pela rua de paralelepipedos. O tempo chuvoso, o céu enferruscado. Relampejava ao longe avisando mais chuva, mas pra mais tarde. Ela ia rápida, pois tinha muito bolo para entregar. Pulava nervosamente alguma poça mal colocada no chão batido de terra. E via nesse instante sua figura lânguida trotar em ar. E gostava, era um prazer ver-se caminhando. Quando falava caprichava na gesticulação, as mãos bailavam num discursso sem fim.
Era ela, simplesmente Alice.